Mas com o livro “Memória de Minhas Putas Tristes” quebrei todos esses meus paradigmas particulares. Estava na minha visita solitária ao shopping, na pós-sessão de cinema de “Up: Altas Aventuras”, e passei na livraria, munido de dezesseis reais livres – troco do ingresso, comes e bebes. Fiquei bastante tempo lá, lendo prefácios e orelhas de livros de bolso e de grandes editoras, resolvido a comprar alguma coisa com o dinheiro que tinha. Olhei, procurei, virei e revirei a livraria e peguei um dos exemplares de “Memória de Minhas Putas Tristes”. Dei de ombros e falei: ‘É você mesmo... é o mais barato daqui”.
Paguei, fui até a fila do ônibus e comecei a ler o livro logo ali, por total falta do que fazer – eram sete da noite e Niterói inteira parecia espremida naquele terminal rodoviário a caminho de São Gonçalo.
Logo que comecei a ler, ainda na fila do ônibus, fui invadido por sensações que dificilmente me invadem – ainda mais no caso de um livro tão pequeno e com letras garrafais como este, com uma gritaria dos infernos de “Bala! Pipoca! Salgadinho! Coca-cola é dois real!”.
Logo ao primeiro parágrafo, o personagem principal do livro fala de suas intenções. É possível perceber toda a melancolia de suas palavras. Com noventa anos, crítico musical e cronista de uma coluna semanal, o personagem principal é notadamente amargurado. Amargurado pela vida longa e aparentemente sem nenhum acontecimento importante; amargurado por uma solidão que se estende de seu nascimento até o dia de seu aniversário de noventa anos.
Tomado subitamente por um ímpeto, ele decide se dar de presente uma noite de amor com uma menina virgem e desconhecida. Para isso, liga para Rosa Cabarcas e deixa tudo acertado para o encontro com a menina. A partir daí, a trama se desenrola. Com maestria, como não poderia deixar de ser.
O lirismo de cada palavra de Márquez é indescritível. O texto, em primeira pessoa, carrega em si toda a solidão do personagem. Eu, particularmente, me pergunto se o próprio Gabo não se confunde com o personagem principal da história.
O livro trata, acima de tudo, sobre o amor. Sobre o amor tardio, sobre o amor não correspondido, sobre o amor platônico, sobre o amor paixão, sobre o amor e sobre o amar. São inúmeros adjetivos e substantivos que se confundem numa mescla de sentimentos e sensações que arrebatam o leitor de forma única.
“No ano de meus noventa anos quis me dar de presente uma noite de amor louco com uma adolescente virgem. Lembrei de Rosa Cabarcas, a dona de uma casa clandestina que costumava avisar aos seus bons clientes quando tinha alguma novidade disponível. Nunca sucumbi a essa nem a nenhuma de suas muitas tentações obscenas, mas ela não acreditava na pureza de meus princípios. Também a moral é uma questão de tempo, dizia com sorriso maligno, você vai ver. Era um pouco mais nova que eu, e não sabia dela fazia tantos anos que podia muito bem estar morta. Mas no primeiro toque reconheci a voz no telefone e disparei sem preâmbulos:
- É hoje.”
Memória de Minhas Putas Tristes, Gabriel García Márquez – Pág. 7
O romance desenhado pelas palavras de Márquez é um ultimato ao amor. Mesmo que tardio e de uma forma completamente inesperada, ele pode acontecer. Recomendadíssimo!
Você vai me emprestar esse livro =)
ResponderExcluirpow vou ler esse livro meu
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